Por Comissão de Justiça e Paz*
A Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Brasília promoveu mais uma Conversa de Justiça e Paz. Desta vez o tema foi “O Brasil que Queremos e o Futuro do Distrito Federal”. O evento, como de costume, aconteceu no Auditório Dom José Freire Falcão, Anexo da Catedral de Brasília, sede da Cúria Metropolitana.
Como convidados foram expositores os Professores Eméritos da Universidade de Brasília ISAAC ROITMAN, Coordenador do Núcleo de Estudos do Futuro da UnB e da Comissão Brasil 2022 – O Brasil que Queremos; e ALDO PAVIANI, fundador do Núcleo de Estudos Urbanos e Regionais da UnB, atualmente Diretor de Estudos Urbanos e Ambientais da Companhia de Planejamento do Distrito Federal – CODEPLAN. Os dois convidados, que já haviam participado de Conversas anteriores, retornaram ao Auditório Dom José Freire Falcão para a abordagem de um tema que nos inquieta e desafia esforços de conhecimento e de mobilização para vencer obstáculos do presente e abrir perspectivas de futuro para o nosso futuro existencial, social, político e planetário.
Em apresentações didáticas e bem documentadas, os expositores traçaram um quadro analítico sobre a realidade nacional e local porém, oferecendo indicações para alcançar um futuro mais esperançoso para o Pais e para o Distrito Federal. As suas apresentações demonstraram plena sintonia com as preocupações atualmente contidas no magistério do Papa Francisco e, tal como expresso na convocatória para a Conversa, identificadas com os enunciados dos principais documentos editados pelo Pontífice.
Com efeito, num tempo de perda de referências éticas, de intolerâncias e de compromissos fraternos, há riscos iminentes para o nosso futuro imediato, global e localmente. A redução do espaço legítimo para a ação política transformadora, que se realize pela mediação da caridade (Evangelii Gaudium, 205) e da misericórdia (Misericordiae Vultus, 12) leva a um fracasso civilizacional em que colapsam as condições de dignidade que são a base do direito a viver e ser feliz (Laudato Si’, 43).
Enquanto se desenfibram os expoentes que poderiam legitimar diretrizes para reorientar percursos, são poucas as vozes confiáveis que logram ser ouvidas. Mas, em tempos sombrios, de fortes contradições, ganha força e carisma o chamamento para grandes esperanças (MV, 25).
É por isso que em todos os hemisférios, em todas as culturas, na heterogeneidade das crenças e na multiplicidade dos mais diversos auditórios, em ambientes intergeracionais, se alarga o alcance do magistério amoroso, generoso e fraterno do Papa Francisco, conclamando o mundo e as comunidades a comungarem iniciativas que levem a realizar projetos-ponte dos povos diante dos projetos-muro do dinheiro, num programa que vise o desenvolvimento humano integral. Tal como ele acentuou em seu discurso aos participantes do III Encontro Mundial dos Movimentos Populares (cf. Vol. 8, Coleção Sendas, Edições CNBB, 2016, p. 14). Trata-se de não perder de vista que “O contrario do desenvolvimento, poder-se-ia dizer, é a atrofia, a paralisia. Temos o dever de ajudar a curar o mundo da sua atrofia moral. Este sistema atrofiado é capaz de fornecer algumas ‘próteses’ cosméticas que não constituem verdadeiros desenvolvimentos: crescimento da economia, progressos tecnológicos, maior ‘eficiência’ para produzir coisas que se compram, se usam e se abandonam, englobando-nos todos em uma vertiginosa dinâmica do descarte… Mas este mundo não permite o desenvolvimento do ser humano na sua totalidade, o desenvolvimento que não se reduz ao consumo, que não se limita ao bem-estar de poucos, que inclui todos os povos e as pessoas na plenitude da sua dignidade, desfrutando fraternalmente da maravilha da criação. Este é o desenvolvimento do qual nós temos necessidade: humano, integral, respeitador da criação, desta causa comum”.
Então, diante do que se discute hoje no país, perguntamos ao Professor Isaac Roitman, dirigente do Movimento “2022 – o Brasil que queremos”, em cuja carta de princípios lemos a preocupação “pela elevação dos valores éticos, de cidadania, entendimento e diálogo, como instrumentos básicos para a superação dos problemas humanos e para o bem estar do povo; comprometida com o fortalecimento de uma cultura de paz”; que sugestões, sinais, caminhos, são possíveis para o fortalecimento, no Brasil, de uma sociedade humana honrada, livre, justa, fraterna, saudável, harmoniosa e feliz?
Assim, como perguntamos ao Professor Aldo Paviani, na qualidade de estudioso de Brasília e de ocupante de lugar estratégico na gestão de planejamento do Distrito Federal, se é possível aqui um futuro para a realização utópica da civitas e da urbs, bela e funcional, pensadas pelos urbanistas do projeto original da cidade e também da polis, obra dos movimentos sociais nela constituídos? Há condições para responder às crises do presente: metropolizacão, ordenamento territorial, esgotamento hídrico, emprego e trabalho, mobilidade, segurança, saúde, educação, participação política?
As respostas tanto mais esclarecedoras quanto amplificadas no mobilizado debate que seguiu-se às exposições, com 14 inscritos, foram organizadas pelos eixos propostos pelos expositores. O professor Roitman seguiu o roteiro temático estabelecido no programa do Movimento 2022: educação, ciência e tecnologia, construção geográfica do espaço, ética, meios de comunicação, política, relações internacionais, saúde, social econômico, ecologia e sustentabilidade. Confira aqui o resumo da apresentação (Apresentação_Isaac Roitman). O professor Paviani conduziu sua apresentação para articular novas questões estruturantes que chamou de”a incógnita do futuro: a cidade que desejamos” (confira aqui Apresentação_Aldo Paviani).
Duas coincidências que cercaram a Conversa e as abordagens. A primeira, considerando o fato de que ambos os expositores na mesma ocasião, expandiram os seus juízos em manifestações mais gerais amplamente divulgadas. O professor Roitman ao anunciar a agenda do Projeto 2022 o Brasil que Queremos cujo programa de ação tem uma agenda próxima aos temas por ele apresentados, conforme documento distribuído durante o evento e que pode ser consultado na página do Projeto (WWW.2022BRASIL.ORG.BR). Por sua vez o professor Paviani, em publicação no Correio Braziliense, na Seção Opinião, edição do mesmo dia 8, com o titulo “Brasília, 57 anos: Conurbação e Verticalidade em Curso” para acentuar as consequências sobre a evolução urbana de Brasília atualmente no epicentro de um processo de metropolização com impactos na qualidade de vida, na mobilidade, na segurança, no trabalho e no emprego e na renda do Distrito Federal e da Região.
A sessão, das mais concorridas apresentou, funcionalmente algumas novidades. Alem da TV Comunitária, cana 12 da NET que regularmente grava e divulga o evento, também cobriu a Conversa a TV Supren, canal 2, da NET, vinculada a ONG União Planetária. Pela primeira vez foi feita transmissão direta pela Internet, via facebook, na página WEB da Comissão Justiça e Paz de Brasília, com o registro de 162 curtidas durante a transmissão. O sistema permitiu, inclusive, a formulação de perguntas dos internautas aos expositores na fase de debate.
Além dos membros da CJP/DF, estiveram presentes representantes da Comissão Brasileira de Justiça e Paz (Ir. Suelli Belato), da Caritas (José Teixeira), paroquianos da Paróquia N. S. da Assunção de Ceilândia Sul, conduzidos pelo PE Moacir Godim que participa de todas as Conversas, Missionários de Juazeiro do Norte em visita pastoral a Brasília, o Padre Geraldo Luiz Canever da Paróquia Santa Rita de Cássia em Planaltina. Também presentes os professores Antonio Teixeira, Maria Luiza Pereira, Erasto Fortes (Ex-Diretor da Faculdade de Educação da UnB e Ex-Conselheiro do Conselho Nacional de Educação) e Nair Bicalho (Núcleo de Estudos para a Paz e Direitos Humanos da UnB, membro do Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos). Presenças também anotadas, do Economista Júlio Miragaya, presidente do Conselho Federal de Economia e de Madalena Torres, professora, membro do MOPOCEM (Movimento Popular por uma Ceilândia Melhor) e professora Celina Roitman, da Fiocruz – Fundação Oswaldo Cruz. Presença destacada do advogado e ex-senador Ulisses Riedel, presidente da União Planetária e dirigente do Movimento 2022 o Brasil que Queremos.
Finalmente, não se deve desconsiderar o fato de que o debate se estabelece numa quadra que anuncia um “grave momento nacional”. Esta designação entitula a mensagem que os Bispos brasileiros, ao final da 55a. Assembléia Geral da CNBB (Aparecida, 26 de abril a 5 de maio), apresentaram à sociedade. Também eles partiram da preocupação sobre “o que está acontecendo com o Brasil?”; constatam “o descrédito e o desencanto com a política”; revelam consternação em face de ameaças ao processo de construção “de uma democracia verdadeiramente participativa”; conclamam a uma “reforma do sistema político brasileiro” que recupere o comprometimento ativo da cidadania para prevenir o favorecimento da “ascensão de ‘salvadores da pátria’ e o surgimento de regimes autocráticos” e indicam “o desenvolvimento social, como critério de legitimação de políticas econômicas”.
A insuficiência dessas condições, diz a mensagem, “está entre as causas da exclusão e da violência, que atingem milhões de brasileiros. São catalisadores de violência: a impunidade; os crescentes conflitos na cidade e no campo; o desemprego; a desigualdade social; a desconstrução dos direitos de comunidades tradicionais; a falta de reconhecimento e demarcação dos territórios indígenas e quilombolas; a degradação ambiental; a criminalização de movimentos sociais e populares; a situação deplorável do sistema carcerário. É preocupante, também, a falta de perspectivas de futuro para os jovens. Igualmente desafiador é o crime organizado em diversos âmbitos da sociedade”. A mensagem conclui, num referencial de atitudes para um Brasil que queremos, no sentido de um “esforço de superação do grave momento atual, (para o que) são necessárias reformas, que se legitimem quando obedecem à lógica do diálogo com toda a sociedade, com vistas ao bem comum. Do Judiciário, a quem compete garantir o direito e a justiça para todos, espera-se atuação independente e autônoma, no estrito cumprimento da lei. Da Mídia espera-se que seja livre, plural e independente, para que se coloque a serviço da verdade…Não há futuro para uma sociedade na qual se dissolve a verdadeira fraternidade. Por isso, urge a construção de um projeto viável de nação justa, solidária e fraterna”.
O debate teve a moderação do professor José Geraldo de Sousa Junior, membro da CJP/DF e a mesa foi aberta com as palavras do Cardeal Dom Raymundo Damasceno, tendo sido presidida pelo engenheiro José Marcio de Moura Silva, presidente da CJP/DF, que proferiu as palavras de encerramento.