Por Isaac Roitman, professor emérito da Universidade de Brasília, em artigo para o Monitor Mercantil em 02/12/2020
Em uma verdadeira democracia, as instituições públicas devem contribuir para o bem comum, para a coletividade. Quando as políticas e ações públicas beneficiarem grupos ou pessoas, principalmente através de desvios de recursos, teremos uma grande ameaça ao estado democrático.
A corrupção no Brasil é antiga. Já no século 16 os funcionários coloniais exportavam por conta própria especiarias, tabaco, metais e peças preciosas. Seguiu-se a traficância dos escravos, a manipulação dos contratos para obras públicas, a corrupção eleitoral do Império, o voto de cabresto da República, o “rouba mas faz”, escândalos financeiros, o “esquema PC” e tantos outros que produzem o “mar de lama”, expressão repetida ao longo do tempo.
O manejo do poder e dos recursos se constitui como tentação que exige um papel de vigilância da sociedade civil. A corrupção é uma grande ameaça para a democracia brasileira. Embora sempre presente na nossa história, ela talvez jamais tenha assumido uma dimensão tão extensa e profunda. Até no combate da pandemia do Covid-19 desviou-se recursos públicos. Que vergonha.
Se não conseguimos superá-la no passado, temos a oportunidade de superá-la no presente para proteger o nosso futuro. Graças à abrangência, à instantaneidade e à liberdade dos meios de comunicação, torna-se hoje mais difícil, senão impossível, ocultar os fatos da sociedade que parece não estar disposta a aceitar a corrupção.
Pessoalmente, penso que a corrupção é uma doença da alma como as doenças definidas como os sete pecados capitais: luxúria, gula, avareza, ira, soberba, vaidade e preguiça. Como todas as doenças, ela não acomete a todos. Muitas pessoas são susceptíveis a ela, outras não.
A corrupção é uma doença incurável. Ela deve ser combatida por exemplo como foi combatida a paralisia infantil que é também incurável. Nesse caso ela foi eliminada pela prevenção, através do desenvolvimento de uma vacina.
A vacina para a corrupção é a educação. Uma educação de qualidade para todos os brasileiros. Ela, além de proporcionar a alfabetização das letras e dos números e preparar para uma profissão digna, deverá exercitar o pensamento e a crítica argumentada e principalmente introduzir e consolidar as virtudes como a solidariedade e a ética. Devemos cumprir a nossa missão geracional e preparar uma nova geração onde a corrupção seja um fenômeno do passado.
Nesse futuro não tão remoto teremos conquistado a utopia de uma verdadeira justiça social, onde cada brasileiro tenha a oportunidade de ser feliz. Nesse contexto é pertinente lembrar o pensamento de Anísio Teixeira: “Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no país a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a escola pública.”
Será pelo aperfeiçoamento do processo democrático que o Brasil se tornará um país com plena justiça social que permitirá a todos/as brasileiros/as conquistarem seus sonhos. Lembremos o pensamento de Nelson Mandela: “Democracia com fome, educação e saúde para a maioria é uma concha vazia.” Independente da ideologia de cada um é importante construir cenários e debater e combater as fragilidades da democracia brasileira.
Embora a passos lentos, vamos consolidando a democracia no Brasil. O bloqueio recente de cortes para a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e das 3 universidades estaduais (Universidade de São Paulo/USP, Universidade de Campinas/Unicamp e Universidade Estadual Paulista/Unesp), foi revertido, graças à pressão da maioria da sociedade.
Em adição, a escolha recente da professora Marcia Abrahão Moura como reitora da Universidade de Brasília/UnB, respeitando a escolha da grande maioria da comunidade universitária, representa um avanço em nosso processo democrático. A conquista de uma democracia plena é a garantia de um futuro virtuoso para o país. Avançando sempre, chegaremos lá.
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