Em primeiro lugar, precisamos deixar claro qual o Brasil que queremos, hoje, e para o futuro? Questão complexa, pois, certamente, não há um consenso nem quanto ao que queremos, tampouco quanto ao modo de colocar em prática um ou outro conjunto de objetivos. Contudo, em que pese à diversidade de pontos de vista, anseios, ideologias e valores considerados importantes para diferentes pessoas, há, aspectos recorrentes nas mais diversas falas e manifestações de indivíduos e grupos sociais. Vejamos alguns desses aspectos, os quais irão orientar o presente texto, como um ideário inicial, a ser aprofundado, coletivamente, com as pessoas que estarão envolvidas mais diretamente com esta temática no Programa “2022 O Brasil que queremos”.
Queremos um Brasil: 1) menos desigual, com maiores oportunidades de estudo, de emprego e de realização pessoal; em que as pessoas se sintam seguras, e possam conviver em paz, em meio à grande diversidade de crenças, ideologias e valores; 3) que lide bem com o meio ambiente, evitando comprometê-lo, mediante exploração indevida; 4) que possa despontar no cenário internacional como exemplo de uma sociedade justa, rica e aberta a outros povos que possam desfrutar de nossas belezas naturais e de nossa hospitalidade; 5) enfim, que seja um lugar com alta qualidade de vida e muita felicidade.
Nesse sentido, há longo espaço a percorrer para atingirmos esses objetivos, a considerar a condição atual e os muitos impasses entre os vários grupos que compõem nossa sociedade. Para isso, muito esforço deve ser colocado em prática, e o conhecimento, inegavelmente, terá um papel decisivo na construção desse novo cenário. Não obstante, muitas das soluções buscadas para problemas identificados como relevantes, estão além do circuito do conhecimento ou da esfera da ciência, da tecnologia e da inovação. Como exemplo, o País já dispõe de muitas tecnologias para extinguir, definitivamente, a fome, ou o analfabetismo; no entanto, tais problemas ainda persistem, ao longo de nossa história.
E por que isso ocorre? Alguns podem dizer que as soluções devem ser encontradas na esfera política. É certo, mas, mesmo assim, não dispensa o conhecimento científico, em particular das ciências sociais, para compreender como se dá a dinâmica da política, como identificar seus impasses, qual o peso que um eventual componente cultural em tal dinâmica, e quais as possibilidades de novos encaminhamentos no fórum político, considerando nossa história e peculiaridades regionais. Em suma, é preciso, também, mais conhecimento, para termos a devida compreensão de por que persistem determinados impasses entre os grupos decisórios, em que pese, uma grande expectativa de solucionar problemas tão importantes como os mencionados anteriormente. E tantos outros, como os que dizem respeito à mobilidade urbana, à violência, à qualidade da educação, à saúde, e à degradação ambiental.
Como premissa para avançar em tal discussão, sobre o papel da ciência, da tecnologia e da inovação para o Brasil que queremos, e em vista das considerações anteriores, propõe-se:
1) A criação de uma agenda de pesquisas, a fim de buscar soluções práticas, para questões prementes, de curto e médio prazo, ou seja, não para seguir, simplesmente, na defesa do conhecimento pelo conhecimento (como um fim em si mesmo); aqui, trata-se de um programa específico, vale ressaltar, não pode ser confundido com as tradições correntes de pesquisa;
2) Uma vez identificadas as questões que demandam soluções práticas, e estabelecidas suas devidas prioridades, levantar-se-iam os diferentes grupos de especialistas e também de pessoas e grupos que, mesmo não fazendo parte dos ambientes de pesquisa, possam colaborar na busca de tais soluções, o que inclui o conhecimento tradicional e os saberes populares;
3) Os grupos de especialistas e detentores de outros saberes, formariam equipes interdisciplinares; como se daria essa logística é objeto de discussão, posteriormente;
4) Em seguida, seriam listadas as possibilidades reais de encontrar as soluções para as questões que receberam as prioridades, nas fases anteriores, tendo em vista o estoque de conhecimentos disponíveis e os recursos a serem envolvidos; deve ser importante, aqui, a arbitragem, por parte dos que compõem o núcleo dirigente do citado programa;
5) Finalmente, são iniciados os trabalhos de pesquisa e as propostas de encaminhamento, a serem dirigidas aos gestores do Programa.
* Professor Associado IV de Sociologia da Universidade de Brasília e Coordenador do Grupo de Estudos de Ciência e Tecnologia do Movimento 2022 O Brasil que queremos.