Por Aldo Paviani, geógrafo e professor emérito da UnB, para o Correio Braziliense em 03/08/2020
O mundo todo está juntando esforços para recuperação das inúmeras fatalidades que a covid-19 acarretou em meses anteriores. Presenciamos tempos velozes de disseminação de uma tragédia impingida por invisível vírus, que ganhou dimensões planetárias a partir da China, como pouco presenciado nas últimas décadas. Ao mesmo tempo, há percursos de tempos lentos no que tange à recuperação da economia e da saúde das respectivas populações. Por isso, é comum a referência a expressões como \”o mundo não será o mesmo\”. E não será em setores das atividades econômicas, como do desemprego e das \”lacunas de trabalho\”.
Ao tempo da pandemia, o desemprego tem estado presente em todos os estados brasileiros e as lacunas de trabalho surgem, embora sempre estivessem acontecendo. Atualmente, todavia, elas intensificaram-se em razão da crise epidêmica. Explique-se que a lacuna de trabalho é diversa do desemprego porque é de outra natureza. O desemprego acontece e pode ser recuperado com a reativação da economia. As lacunas de trabalho, ao contrário, ocorrem quando o posto de trabalho foi eliminado permanentemente ou quando postos de trabalho novos não são criados. As lacunas de trabalho são pouco visíveis e identificáveis porque são tidas como desemprego. Sim, é uma situação de desemprego cruel e permanente para os trabalhadores, dado que não há retorno à situação anterior.
Então, com a pandemia, em diversos pontos do território, o tempo é veloz na eliminação de vagas em empresas que, por sua vez, fecham as portas, pois, o consumo reduziu-se em função do isolamento social e a redução do consumo não essencial. Para se ter estatísticas das falências de empresas, há exigência de tempos longos com pesquisas a realizar em todo o território nacional. Essas pesquisas dariam a dimensão aproximada das lacunas de emprego, separando-as do desemprego, o qual esperamos que seja superado pelo aquecimento econômico pós-pandemia.
No Distrito Federal, a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED – Codeplan/Dieese/Setrab), de maio último, revelou taxa de desemprego de 21,3% e atingiu 333 mil trabalhadores. Os numerosos desempregados, como não possuem renda, também não têm acesso ao consumo, pois não produzem, afetando a economia da capital federal. Esse processo é circular e cumulativo e gera quebradeira de empresas e cancelamento de postos de trabalho, confirmando minha hipótese sobre a evidência de lacunas de trabalho. E há outra circunstância: a PED para cada uma das quatro categorias agrupadas de acordo com a renda média das Regiões Administrativas (RAs) indica para a mais baixa renda uma taxa 10,4% mais elevada do que a média ou 31,7. A PED, para detectar as lacunas de trabalho, poderia incluir pesquisas específicas nas empresas e no serviço público.
De fato, os dados sobre a situação de pandemia que a mídia nos traz são preocupantes pois, mais pessoas são infectadas a cada dia: eram 33 no início da pandemia, sendo suspeitas 174 pessoas, em 3 de março passado; elevaram-se para 563 (com 14 óbitos), em 11 de abril; em 12 de maio, eram 2.799 pessoas contaminadas, com 1.605 recuperadas ou 57% e 44 mortes; em 16 de junho, aumento significativo de infectados: 25.380, 60% dos quais se recuperaram (15.172 pessoas) e 348 óbitos. As UTIs, somando-se as de hospitais privados e públicos, 626 estavam ocupadas, ou 88%.
Demarca-se, em Brasília, com dados recentes que, em 16 de julho, os infectados mais do que dobraram, em relação a 16 de junho: 75.380 infectados, com 81% de recuperados ou 61.618 pessoas. Em 31 de julho, a evolução revela-se preocupante: infectadas são 104.442 pessoas; 83% ou 86.791 pessoas recuperadas; em 24 horas, 2.100 pessoas foram contaminados e 25 óbitos. O total de falecimentos atingiu 1.444 pessoas nesta data, ocasião em que 83% de UTIs estavam ocupadas. Nesse ritmo, chegaremos a 120 mil infectados e 1.500 óbitos.
Por fim, resta considerar que algumas estratégias, tanto na esfera federal quanto local, cometeram equívocos no que tange ao desejo de ver a economia voltar ao esquema de \”antes\”, com a reabertura de atividades econômicas, inclusive algumas não essenciais, como salões de beleza, academias e barbearias – considerando-se a crise persistente. No DF, acertada foi a construção de hospitais de campanha e o excelente trabalho dos operadores, médicos, enfermeiros e técnicos dos hospitais, o que propiciou elevado percentual de recuperação de infectados, em média, acima de 80%, constantemente, o que é digno de elogios.
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